Elsa Rodrigues, natural da freguesia, lançou o livro “Depois do pôr do sol” em que fala sobre o percurso de quem acompanha um ente querido com doença prolongada. Psicóloga clínica há 24 anos, a autora aborda o processo de acompanhamento de um doente e dos que o rodeiam e assume que escrever este livro foi para si uma espécie de “catarse” mas que acima de tudo é uma história de amor.

Luz da Serra: Como surgiu o livro “Depois do pôr do sol”?

Tinha o grande sonho de escrever mas nunca tinha tido a coragem de avançar. O livro surgiu na sequência do processo de doença prolongada da minha mãe. Nunca pensei escrever sobre isso mas quando fiz uma formação intensiva sobre Interioridade, precisamente um mês e meio depois da minha mãe ter falecido, tive um certo ímpeto de «vou escrever sobre isto, sinto necessidade de escrever sobre tudo o que passei e talvez me faça bem». Acredito que a escrita é terapêutica e foi um bocadinho nesse sentido, não com intenção de publicar.

As coisas foram surgindo e eu fui escrevendo. Recordo-me de todos os dias a que acompanhei a minha mãe em consultas, a tratamentos e nunca apontei nada, a minha memória emocional é assim. Fui escrevendo e fui-me entusiasmando com a ideia. A dada altura decidi dividir o livro por capítulos, é um livro simples, pequenino, mas muito intenso em termos emocionais. Organizei os 563 dias que distanciam o dia que soube o diagnóstico até ao dia em que a minha mãe partiu, por capítulos de acordo com os momentos que eu entendi mais significativos e acabam por refletir muito o que fui sentindo ao longo do tempo.

Faz ainda um pouco o paralelismo com o que dizemos do luto, das várias fases dele e a minha reflexão final vai muito nesse sentido. O luto para mim começou no dia em que soube o diagnóstico e não no dia em que a minha mãe partiu, esse dia foi a constatação que efetivamente o fim foi inevitável.

Ao mesmo tempo, foi com muita esperança, no ano da esperança do Papa Francisco, e quando escrevi cheguei ao fim com sentimentos que eu não imaginava que pudesse sentir quando perdi o grande pilar da minha vida. Cheguei com um sentimento diferente daquilo que eu imaginava e que achava que era impossível ao viver sem ela diariamente.

É um livro que ativa a emoção de quem lê. Foi muito chorado. Foi uma catarse para mim e uma forma de trabalhar o meu luto.

LS: Já tinha tido contacto com o mundo editorial?

Não. Escrevi e sem ninguém saber decidi enviar para a Cordel de Prata, a editora, e senão tivesse condições para ser editado tudo certo, só queria ter uma opinião. Passado um mês mandaram uma mensagem a informar que tinha reunido todas as condições para ser editado, que consideravam o conteúdo interessante, que teria público alvo e se eu pretendia avançar. E decidi avançar.

Descobri com isto que gosto de escrever sobre vidas de pessoas.

LS: Quanto tempo demorou a escrever?

Comecei o livro por três etapas: em novembro de 2023, depois em abril de 2024 e fui parando, achei que não ia fazer nada. Em agosto tive um impulso de voltar a escrever. Como estava de férias e gosto muito de escrever à noite, fiz muitas madrugadas e foi aí que concluí, organizei em capítulos e dei corpo ao livro. Até agosto tinha talvez 15 páginas escritas e nesse mês ganhei impulso e todos os dias me dedicava ao livro cerca de 4/5 horas pela madrugada que é quando gosto de escrever.

Escrevi em segredo porque a minha ideia não era estar a publicitar nem dizer que ia fazer.

É uma coisa muito minha, muito pessoal e acho que há pessoas que passando pelo mesmo pode fazer todo o sentido porque vão identificar-se, vão rever-se e vão, talvez, sentir um apoio emocional na escrita porque sentem o mesmo.

Quando houve a oportunidade de lançar o livro pensei «é um pouco insensato para comigo e desrespeitoso perante a homenagem que eu quero fazer ao amor por alguém que nós gostamos tanto isto ficar completamente em off.»

Irei fazer duas apresentações, uma em Leiria que está prevista a 4 de outubro na Biblioteca Municipal às 17h00 e outra que será em Fátima, onde a minha mãe trabalhou durante 28 anos, no Museu de Arte Sacra e Etnologia ainda sem data marcada.

LS: O que foi mais difícil ao longo deste processo de escrita? Foi difícil criar um distanciamento?

Foi escrever sobre o processo de decadência da minha mãe e foi perceber que nunca perdi a esperança mas com consciência plena que a minha mãe não ia conseguir sobreviver.

Uma grande amiga a que pedi para ler o livro perguntou-me «como expuseste tanto a tua intimidade?». E eu não tinha essa noção. Isto é também uma prova de amor para com as pessoas que possam passar pelo mesmo porque expus mesmo a minha intimidade emocional e o que fui sentindo: a angústia, a tristeza, a esperança e a alegria às vezes infundada num pequenino sinal.

LS: O livro fala sobre um processo de acompanhar uma doença prolongada. Em que consiste realmente?

É um pouco um eufemismo. É sobre acompanhar um doente num processo de doença prolongada, o percurso de alguém que ama incondicionalmente essa pessoa e que tem de aprender a perdê-la, a treinar a perda. Fui-me treinando para aquilo que nunca quis que acontecesse, mas que sabia que, infelizmente, era aquilo que iria acontecer. E também relato a experiência das pessoas que estão ao lado.

LS: O que espera que este livro traga a quem lê?

Espero que possam sentir um pouco isto que estou a descrever, que não é fácil. Já duas ou três pessoas o leram. Ofereci à minha família, naturalmente, e alguns não conseguem ler, disseram que ainda não estão preparados. Espero que mostre principalmente que a minha mãe era uma grande mulher. Era isso que eu desejava pois não queria que os meus filhos se esquecessem dela. Este foi o ímpeto principal, perceberem que a minha mãe tinha sido uma mulher extraordinária na minha vida e como eles eram pequenos poderiam não ter a noção da força que ela tinha. E também mostrar a importância do amor, a importância da família e que nós temos sempre força para dar a volta e para superar nem que seja uma coisa extremamente difícil como foi vê-la partir.

LS: Considera que estes temas por vezes são pouco falados, que as pessoas têm receio de falar?

Sim, as pessoas têm muito medo e tenho na minha mente vários momentos difíceis, como por exemplo quando partilhámos a notícia. Mas depois, acho que a minha mãe nunca se sentiu tão amada como neste processo todo. No meio de todo um processo de sofrimento há grandes surpresas que vão surgindo, as pessoas que apoiam. Isto permitiu, e isso agradeço muito, que tivéssemos consciência da importância de tudo. A importância de estar na presença dela, de toques, de apenas estar, de olhares. De outra forma, a vida é muito corrida e uma doença destas às vezes permite-nos isso.

LS: Qual o feedback que tem tido?

Há pessoas que se emocionam, com partes diferentes, curiosamente. Afirmam que é muito emotivo, que é de uma grande coragem, que a minha mãe devia ser uma grande mulher e que é uma história de amor.

LS: Qual a mensagem principal que quer passar?

Que a esperança e a coragem são fundamentais. E que se deve acreditar sempre porque felizmente há finais felizes. O nosso não foi mas há finais felizes e aqueles que não são, é termos a noção de que o amor é o mais importante e o verdadeiro amor nunca morre. É a mensagem que a esperança e a coragem vão sustentar-nos sempre para apoiar o máximo e garantir o máximo de qualidade de vida àquela pessoa e, pelo menos, que ela parta com a noção de que foi muito bom o que nós vivemos. Sobretudo é uma mensagem de esperança para quem passa pelo mesmo.

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Conheça um pouco da história

Sinopse

E quando tudo acaba antes mesmo de acabar. Uma experiência prévia de finitude, ainda que haja algum tempo. A constatação de que a esperança e a expectativa foram parceiras inseparáveis, mas não venceram.

A angústia emocional espelhada na impotência de nada conseguir, diante de uma doença prepotente e autoritária. Aprender a viver com o presente, com o aqui e agora, valorizando o pouco como sendo muito.

Acumular memórias, muitas memórias, memórias de dias, de momentos, de toques, de olhares, de conversas, de sentimentos, de silêncios… afinal, é o que fica.

Aceitar que depois do pôr do sol, um novo dia nasce, mas nasce diferente, e para sempre, tudo passa a ser diferente.

Um livro que nos relata a experiência da dor antecipada de perder quem amamos. Uma história real, vivida na primeira pessoa que pretende chegar a todas as pessoas enquanto mensagem de amor e esperança, apesar da inevitabilidade do fim.

Data da publicação: 1 julho, 2025

Páginas: 64

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